domingo, 28 de junho de 2009

A Estratégia e as dúvidas do estratego em tempos de crise

Um grupo de vinte e oito economistas – professores, gestores, consultores, ex-ministros com experiência governativa longa, curta, recente ou muito antiga – resolveram dar um contributo à nação através do estudo e da opinião sobre o acerto das decisões sobre os investimentos públicos em grandes obras de infra-estruturas e da sua oportunidade. É saudável que se debata se as opções de combate à crise de 2008, em Portugal, passam pelos investimentos públicos em grandes ou pequenas obras ou se se devem privilegiar as responsabilidades do défice orçamental e dos montantes da dívida pública.

Como referi na nota que antecede esta no blog, tratam-se de decisões estratégicas para o nosso país pelos pressupostos que as caracterizam. E a Estratégia, corpo de conhecimentos acessíveis, invocada por todos, desde políticos a vendedores de automóveis, reduzida indistintamente ao bom senso e ao senso comum… foi considerada como uma reflexão que conduz à decisão e esta à acção. Depois da chamada Estratégia da Dissuasão Nuclear também se pode considerar que há estratégias que pretendem evitar a acção. A Estratégia, como conjunto de teorias, pode ser considerada uma teoria sem prática, neste caso, uma teoria da não-acção.

Dito isto, o melhor é entender a Estratégia como uma ciência (?), uma arte (?) que professa algumas ambiguidades. Mas, se atendermos aos inexoráveis desvios entre tudo (quase tudo?) o que é planeado obter e os resultados alcançados, então, a estratégia definida é, normalmente, algo eminentemente aleatório e incerto. Todavia, estas características da arte não conferem a menor humildade aos seus cultores estrategos, quer na área militar, quer na empresarial, quer na política… Porque, antes de qualquer atributo, é preciso acreditar na estratégia a adoptar, seja ela qual for…

A este respeito os militares têm uma colocação exemplar. O estado-maior do Comando prepara a decisão, apresentando várias propostas de decisão ao comandante e informa qual é a proposta preferida pelo Estado-Maior. Diz o regulamento de operações que vem desde o Conde de Lippe que “o Comandante retira-se e decide sozinho”. Forma elegante de dizer que a responsabilidade é inteiramente dele! E diz ainda que a partir da tomada da decisão pelo comandante, “o Estado-Maior passa a considerar a decisão como a sua melhor proposta”… (Cito de memória, mas creio que as palavras têm o sentido que é aqui transmitido). A Decisão adquire assim um carácter aglutinador e mobilizador. Adquire o sentido contrário ao que se tem assistido na sociedade portuguesa, onde, logo que há uma decisão, surgem dúvidas sobre ela. Foi assim no Novo Aeroporto de Lisboa, está a sê-lo nas auto-estradas e no TGV. É certo que as más decisões abundam em Portugal. São históricas e de anedota. Só como exemplo, a última estação que se inaugurou do metro de Lisboa, que tem 40 anos, a estação de Santa Apolónia, deveria ter sido a primeira, para iniciar a ligação do comboio de Vila Franca à cidade! Andámos 40 anos a errar…

Todavia, quer por receios sobre o que a decisão significará no futuro, quer por interesses apoiados ou contestados ou, simplesmente, porque a responsabilidade das decisões não são devidamente atribuídas ou assumidas e são, ainda e quase sempre, mal explicadas, a verdade é que se instala a dúvida na opinião pública sempre que chega a hora de decidir. E parece que seja de admitir que a descrença sistemática na decisão, antes de conhecidos os seus efeitos, resulta da falta de confiança em quem decide.
Mas o que chega a ser engraçado, no campo ambíguo e aleatório dos conhecimentos da Estratégia, é que a incerteza e a dúvida são ínsitas do trabalho do estratego. A sua lógica é probabilística. Contudo, está para nascer o primeiro estratego que confesse que duvida da sua estratégia. Mas daqui a defender-se que é preferível viver sem decisão, sem acção, porque há uma crise, é o mesmo que adoptar a estratégia de dissuasão quando as bombas já começaram a rebentar… A crise está aí e é preciso combatê-la! Sair dela bem, ou seja, na “melhor posição possível de competitividade relativa”.

A Estratégia e as dúvidas do estratego em tempos de crise







Um grupo de vinte e oito economistas – professores, gestores, consultores, ex-ministros com experiência governativa longa, curta, recente ou muito antiga – resolveram dar um contributo à nação através do estudo e da opinião sobre o acerto das decisões sobre os investimentos públicos em grandes obras de infra-estruturas e da sua oportunidade. É saudável que se debata se as opções de combate à crise de 2008, em Portugal, passam pelos investimentos públicos em grandes ou pequenas obras ou se se devem privilegiar as responsabilidades do défice orçamental e dos montantes da dívida pública.

Como referi na nota que antecede esta no blog, tratam-se de decisões estratégicas para o nosso país pelos pressupostos que as caracterizam. E a Estratégia, corpo de conhecimentos acessíveis, invocada por todos, desde políticos a vendedores de automóveis, reduzida indistintamente ao bom senso e ao senso comum… foi considerada como uma reflexão que conduz à decisão e esta à acção. Depois da chamada Estratégia da Dissuasão Nuclear também se pode considerar que há estratégias que pretendem evitar a acção. A Estratégia, como conjunto de teorias, pode ser considerada uma teoria sem prática, neste caso, uma teoria da não-acção.

Dito isto, o melhor é entender a Estratégia como uma ciência (?), uma arte (?) que professa algumas ambiguidades. Mas, se atendermos aos inexoráveis desvios entre tudo (quase tudo?) o que é planeado obter e os resultados alcançados, então, a estratégia definida é, normalmente, algo eminentemente aleatório e incerto. Todavia, estas características da arte não conferem a menor humildade aos seus cultores estrategos, quer na área militar, quer na empresarial, quer na política… Porque, antes de qualquer atributo, é preciso acreditar na estratégia a adoptar, seja ela qual for…

A este respeito os militares têm uma colocação exemplar. O estado-maior do Comando prepara a decisão, apresentando várias propostas de decisão ao comandante e informa qual é a proposta preferida pelo Estado-Maior. Diz o regulamento de operações que vem desde o Conde de Lippe que “o Comandante retira-se e decide sozinho”. Forma elegante de dizer que a responsabilidade é inteiramente dele! E diz ainda que a partir da tomada da decisão pelo comandante, “o Estado-Maior passa a considerar a decisão como a sua melhor proposta”… (Cito de memória, mas creio que as palavras têm o sentido que é aqui transmitido). A Decisão adquire assim um carácter aglutinador e mobilizador. Adquire o sentido contrário ao que se tem assistido na sociedade portuguesa, onde, logo que há uma decisão, surgem dúvidas sobre ela. Foi assim no Novo Aeroporto de Lisboa, está a sê-lo nas auto-estradas e no TGV. É certo que as más decisões abundam em Portugal. São históricas e de anedota. Só como exemplo, a última estação que se inaugurou do metro de Lisboa, que tem 40 anos, a estação de Santa Apolónia, deveria ter sido a primeira, para iniciar a ligação do comboio de Vila Franca à cidade! Andámos 40 anos a errar…

Todavia, quer por receios sobre o que a decisão significará no futuro, quer por interesses apoiados ou contestados ou, simplesmente, porque a responsabilidade das decisões não são devidamente atribuídas ou assumidas e são, ainda e quase sempre, mal explicadas, a verdade é que se instala a dúvida na opinião pública sempre que chega a hora de decidir. E parece que seja de admitir que a descrença sistemática na decisão, antes de conhecidos os seus efeitos, resulta da falta de confiança em quem decide.
Mas o que chega a ser engraçado, no campo ambíguo e aleatório dos conhecimentos da Estratégia, é que a incerteza e a dúvida são ínsitas do trabalho do estratego. A sua lógica é probabilística. Contudo, está para nascer o primeiro estratego que confesse que duvida da sua estratégia. Mas daqui a defender-se que é preferível viver sem decisão, sem acção, porque há uma crise, é o mesmo que adoptar a estratégia de dissuasão quando as bombas já começaram a rebentar… A crise está aí e é preciso combatê-la! Sair dela bem, ou seja, na “melhor posição possível de competitividade relativa”.




terça-feira, 16 de junho de 2009

TGV: é ou não estratégico?



Quando Sun Tzu disse há cerca de 2500 anos que a Estratégia tinha de ser feita de acordo com os ‘deuses e as terras’, esta era a maneira que ele tinha de dizer que as estratégias têm de ter em conta o ‘tempo e o espaço’. Com os tempos mudam as vontades mas a geografia, o terreno sobre o qual a Estratégia elege opções e decisões é imutável. Os factores físicos são oportunidades ou condicionantes. Facilitam ou dificultam as opções, ou seja, a sua concretização com o menor custo.

Não revelo nenhum segredo se disser que Portugal é um país periférico em relação à Europa… Afasto a argumentação de que o país se encontra no âmago de uma centralidade mais vasta, compreendendo a América Latina, África e a tal porta de entrada do Atlântico, esquecendo quem acha que Lisboa não tem de ter porto de mar… e quem ignora a concorrência doutros portos europeus, onde os cidadãos gostam de ver guindastes, navios, contentores, docas, barcos de recreio, bares, restaurantes etc… E afasto porque mais de 80% do nosso comércio se faz com a Europa, o que não significa que tal situação não signifique um constrangimento estratégico, a contrariar com a abertura das nossas exportações a outros continentes. Razão porque aplaudi a publicidade do Presidente Chaves a atirar com o Magalhães ao chão!...

A distância periférica resultante da nossa localização geográfica constitui uma vulnerabilidade estratégica que só pode ser compensada com transportes mais rápidos, mais económicos e ecologicamente sustentados. Não consigo imaginar como se pode defender uma opção estratégica diferente. Como se pode aceitar que o país contíguo faça um TGV até Badajós e nós não o queiramos fazer de Badajós a Lisboa. Peço desculpa da minha “arrogância teórica” mas quem acha que Portugal, os nossos portos, claro, não têm de estar ligados por bitola europeia de caminho de ferro ao centro da Europa… não está com os deuses de Sun Tzu. Os tempos são de TGV. O modo é a velocidade, pensaria hoje quem pensou estrategicamente no tempo em que só havia carroças.

Também se fala na oportunidade desta decisão, tomada em momento de crise e com elevado endividamento público. O que é estratégico tem necessariamente relação com o que é essencial ou importante, com o meio exterior e com o futuro. O TGV é uma infra--estrutura com estas três componentes. É portanto um investimento estratégico. Adiá-lo, não o fazer, é não cumprir, é falhar no essencial, é comprometer o futuro e acentuar uma das nossas vulnerabilidades estratégicas: a situação periférica. Na lógica iterativa que caracteriza o pensamento estratégico, as capacidades para a realização dos objectivos têm de ser adquiridas, dentro de um planeamento que confere oportunidade ideal à execução dos objectivos mas a opção do seu abandono é a derrota, a desistência.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

As interpretações da verdade dos números

A verdade dos números não pode ser desmentida,é quantitativa. Mas também pode ser qualificada. E qualificada com os argumentos, as ideias do arsenal intelectual e o ângulo de visão de cada um. O raciocínio técnico precisa de quantificar mais e qualifica menos. No político dá-se o contrário: não deixando de quantificar, carece de qualificar muito mais.

Ontem o PSD ganhou as eleições para o Parlamento europeu. Ganhou por cinco por cento a mais que o segundo lugar, o PS, ficando com cerca de 32%. Longe da maioria que o PS tem para formar governo maioritário, a interpretação dada pelos dirigentes sociais democratas sugere que entramos num novo ciclo político, caracterizado pelo descontentamento com as políticas do governo PS. Logo, a hipótese plausível de ganhar as próximas legislativas.

A verdade dos números está nos portugueses que votaram. A verdade qualificada está na cabeça de cada um, dos intérpretes, comentadores e, cá na minha, nas dificuldades que a crise nos começa a infligir e levou muita gente a votar de protesto, contra a situação difícil, penalizando o partido que forma governo.

Mas há outras verdades apenas qualitativas, como a de dois candidatos serem ao mesmo tempo candidatos a duas das maiores câmaras municipais do país. Fica mal. Significa que não acreditam na eleição municipal e querem garantir ocupação europeista. O cabeça de lista que me pareceu de início uma optima escolha... enganou-me. Deu tiros no pé, mas tiros de canhão e continuo a considerá-lo que se propunha à campanha mais séria, pela consistência dos temas que poderia debater mas que não interessavam minimamente à imprensa e, provavelmente, às pessoas. E deixou-se envolver em dificuldades que ele próprio criou, como a do José Manuel Barroso. Dá a impressão que José Sócrates não falou dois minutos sobre os temas do PS e do Governo para as eleições europeias com Vital Moreira, tal era o afastamento de posições de um e outro.

Depois há uma realidade psico-sociológica preocupante e estúpida mas que tem reflexos nos resultados eleitorais. É que para um “jovem” com menos de 30 anos, alguém com mais de 50 é velho! E para velho já basto eu… diz uma grande parte da nossa população.

terça-feira, 2 de junho de 2009

O discurso na campanha para as europeias

O discurso na política


“Falar verdade”, Manuela Ferreira Leite. “A verdade é mobilizadora”, Cavaco Silva. “A verdade a que temos direito”, Jornal Avante. “Só a verdade é revolucionária”, Marx. “Quem és tu?, pergunta Pilatos. Eu sou a verdade, responde Cristo”.
Isto é o que me vem mais imediatamente à memória, mas em que contexto isto foi mesmo dito e que significado tem para cada um?

A verdade é só uma ou é uma para cada um? A verdade democrática é aquela em que a maioria acredita ou são todas as que podem ser formuladas com liberdade de exame e opinião? As verdades certas e as erradas. Decididamente não é o tipo de verdade sentenciosa, indiscutível, do tipo de quem fala com a liberdade na barriga… ou no bolso, fazendo muitas vezes da ignorância uma fonte de argumentos, a opinar sobre tudo e quando muito bem quer, como ocorre frequentemente com os comentaristas de serviço na imprensa. Raramente se lhes ouve: “Disso eu não sei, não estou informado”.

O maior problema, salvo melhor opinião (bonito!…), talvez (que humildade!…), resida no discurso político. No discurso, omitir a verdade não é mentir e mentir não implica na negação da verdade. Pelo contrário, a mentira ganha credibilidade se misturada com a verdade… A noção de que a verdade e a falsidade se excluem, são categorias opostas, só existe na lógica. No discurso, esta lógica depende de outros elementos determinados pelos objectivos a atingir, como se vê exemplarmente nesta campanha eleitoral para o Parlamento europeu, desenvolvida por alguns líderes políticos. A verdade para alcançar os objectivos é a que figura nos discursos, numa metalinguagem.

Grave, também, é a falta de coerência e honestidade do discurso, dissimulados na torrente de verdades e mentiras que os meios de comunicação são incapazes de identificar e, assim, contribuir para que a verdade obtivesse maior funcinalidade. O valor da verdade não está inscrito no comportamento político a que se tem assistido nesta campanha para as europeias. O PSD e o CDS que fazem parte da mesma formação política no parlamento europeu e são o maior grupo, e formam maioria, falam como se fossem inimigos e lutassem contra a maioria do PS… também na Europa, que não existe… Aliás, o PCP e o Bloco também estão associados na Europa e acusam o PS e o PSD de estarem juntos nas políticas. Quais? Em algumas estarão, claro, mas no Parlamento de cá como no de lá o confronto é visível.

Como já se deram conta de que eu defendo a verdade múltipla… ouso dizer que o candidato Vital Moreira é de todos o que tem colocado mais temas à discussão dos portugueses e tido um comportamento e um discurso mais preocupado com as verdades afirmadas do que com os efeitos das mentiras ditas. Sem demagogices!
Manuel Pedroso Marques.